«O projecto de construção de um conjunto de
armazéns e espaços multiusos na zona das antigas salinas de Alverca, a
sul da Ogma-Indústria Aeronáutica de Portugal, está a gerar
controvérsia. O movimento de cidadãos Xiradania afirma que está em causa
um dos espaços naturais mais importantes da margem norte do Tejo e a
CDU aponta irregularidades no processo.
As salinas de Alverca e do Forte da Casa são
consideradas, desde 2002, um local de importância ambiental para aves
(IBA), segundo a BirdLife Internacional – uma federação de organizações
não-governamentais para a protecção da ornitologia. No entanto, esta
classificação ambiental não confere qualquer protecção. “Existem mais de
cem áreas IBA, em Portugal, e em 70% dos casos, estas áreas estão
englobadas pelas zonas de protecção especial da rede Natura 2000”,
explica Joana Andrade, da Sociedade Portuguesa de Estudo das Aves
(SPEA). Contudo, em Alverca não existe essa protecção.
O
empreendimento da Arco Central (empresa ligada ao grupo Obriverca e ao
Banco Espírito Santo) pode ser aprovado com base no antigo Plano
Director Municipal (PDM) de Vila Franca de Xira, uma vez que à luz do
novo PDM o loteamento não poderia avançar. A votação final no executivo,
que esteve prevista para 25 de Julho, foi adiada para uma próxima
sessão, porque a CDU contestou o facto de o relatório final da consulta
pública da proposta de loteamento não contemplar uma exposição do
movimento Xiradania.
Em causa está um loteamento para 41
hectares, entre a linha férrea, a Ogma e o rio da Verdelha. Em Junho, a
câmara despachou favoravelmente o estudo de loteamento que prevê cerca
de 94.600 metros quadrados de construção, 1342 lugares de estacionamento
e 151.000m2 de áreas verdes, para equipamentos colectivos e cedências
ao município. Estão previstos três lotes para edifícios multiusos, de
comércio e serviços, com dois pisos e dez metros de cércea. No total,
ocupam cerca de 270.000m2, com 94 mil de área de construção. O acesso
será feito pelo viaduto de ligação à EN116 já existente.
Na
reunião camarária de 27 de Junho, PS e Coligação Novo Rumo (PSD/PPM/MPT)
votaram a favor do encaminhamento do processo para discussão pública. A
CDU votou contra, por discordar da aprovação com base no antigo PDM,
quando o actual já está em vigor desde Novembro de 2010. Os socialistas
recordam que o loteamento tem por referência o PDM na versão de 1993 e
que esteve na base de um protocolo entre os promotores e a autarquia,
que levou a empresa a ceder à câmara os terrenos já utilizados na
construção da Estação de Tratamento de Águas Residuais de Alverca, da
bacia de retenção e do nó rodoviário.
Riscos de indemnizações?
Os
serviços de urbanismo atestam que a proposta de loteamento cumpre as
opções previstas no PDM de 1993, que preconizava para aquela área
grandes equipamentos, instalações do sector terciário, indústrias
compatíveis e armazenagem. O estudo tem pareceres favoráveis da Rede
Ferroviária Nacional e da Administração da Região Hidrográfica do Tejo e
que contempla também a cedência ao município de terrenos para a
requalificação da frente ribeirinha.
Já com o novo PDM em vigor,
que coloca esta área na estrutura ecológica urbana e sem qualquer
construção, os promotores pediram esclarecimentos à autarquia de Vila
Franca, em 2010 e 2011, considerando que existem “direitos adquiridos” e
que a apreciação do loteamento deve ter por base o antigo PDM.
Pareceres jurídicos então solicitados concluíram que o licenciamento
deve ser visto à luz do PDM de 1993, e não do de 2010, devido à
existência do protocolo. E afirmam que o município pode vir a ser
responsabilizado financeiramente por alguma eventual perda de direitos
dos promotores devido à existência de uma informação prévia favorável.
Xiradania recusa direitos adquiridos
O
movimento cívico Xiradania apresentou a única exposição entregue na
consulta pública do loteamento e afirma que, em situações semelhantes, a
câmara decidiu “aplicar as normas do actual PDM e não o de 1993”. A
aprovação do loteamento da Arco Central, acusa, iria “criar uma situação
de profunda injustiça e de clara violação de princípios fundamentais da
actividade administrativa: o da imparcialidade e o da igualdade”. O
movimento aponta decisões judiciais que concluem que “os protocolos não
constituem, no nosso ordenamento jurídico, uma fonte válida de
constituição de direitos de edificação”. E, notam, “toda a área de
intervenção deste loteamento se encontra dentro dos limites das áreas
inundáveis, da estrutura ecológica municipal e na Reserva Ecológica
Municipal e, parcialmente, dentro de um corredor ecológico estruturante
da Área Metropolitana de Lisboa”.
No entender deste movimento
cívico, não fará sentido avançar com mais este loteamento de logística
quando a polémica plataforma da Castanheira do Ribatejo e a respectiva
área de expansão “são um verdadeiro deserto empresarial de 150 hectares”
e existem “inúmeros armazéns vazios distribuídos por todo o concelho”».
Por Jorge Talixa, Fábio Monteiro