Como não tivemos oportunidade de o fazer anteriormente, transcrevemos de seguida o conteúdo da participação escrita individual da nossa associação (datada de 06 de agosto) na fase de discussão pública do processo de loteamento n.º 10/03LOTEPDM, no local da Verdelha e Drogas, na freguesia de Alverca do Ribatejo, conhecido como o loteamento das salinas de Alverca e Forte da Casa.
Achamos importante fazê-lo para tornar pública a posição da nossa associação e ao mesmo tempo congratular-nos com a não aprovação deste loteamento pela CMVFX (votos favoráveis do PS foram 5 e 6 contra da CDU e PSD), na passada reunião de 5 de setembro, graças àção dos movimentos cívicos e ambientais (XIRADANIA; SPEA; QUERCUS; GEOTA; FAPAS; ADAPA; e Os Amigos do Forte) que se envolveram nesta questão. Conseguimos com as participações individuais e conjunta fazer ver à maioria dos vereadores que para lá de um gravíssimo erro ambiental e de ordenamento do território este loteamento era ilegal (pois baseava-se em normas que não se encontram em vigor à data do seu surgimento e, por outro lado, por colidir com mais elementares regras de ordenamento do território).
Transcrição da participação:
«Tendo a Câmara de Vila Franca de Xira aprovado, em reunião de câmara de 27 de junho, a operação de loteamento n.º 10/03 LOTEPDM, no local da Verdelha e Drogas, na freguesia de Alverca do Ribatejo, e encontrando-se a decorrer o período de discussão pública, nos termos do art. 22.º do Decreto- Lei 555/99, de 16 de dezembro, na redação da Lei n.º 60/2007, de 4 de setembro, que aprovou o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, vêm Os Amigos do Forte apresentar participação escrita nesse período de discussão.
Quanto ao enquadramento da área onde se insere o loteamento, cumpre lembrar que a zona em referência, também conhecida como Salinas de Alverca, é uma área sensível, trata-se do habitat de uma assinalável diversidade de espécies de aves (cerca de 200 entre residentes e migratórias), as quais encontram nesta zona da margem direita um dos últimos refúgios para a sua nidificação e vivência.
Como prova desta importância, regista-se o facto de a zona deter a classificação não governamental de International Bird Area (IBA), a nível municipal se encontrar classificada como estrutura ecológica urbana (local onde não é possível construir) e, ao nível da área metropolitana (PROTAML), é considerado um corredor ecológico estruturante.
A este propósito, citamos o biólogo Nuno Lecoq: «apesar de apresentarem alguma degradação, fruto das intervenções que têm sofrido nos últimos anos, nomeadamente na sua envolvente, as salinas de Alverca e Forte da Casa são o último reduto natural da margem direita do estuário. Efetivamente, existe um potencial gigantesco do ponto de vista da conservação da natureza e do turismo, caso esta zona seja devidamente gerida, o que trará benefícios para quem ali vive».*
Depois, importa relembrar que toda a margem direita do rio Tejo inserida no concelho de Vila de Xira tem sido fortemente pressionada com diversas operações urbanísticas, as quais lhe têm transfigurado a face, roubado a beleza, a riqueza e o futuro. São exemplos os casos reais (pelo menos no papel) da plataforma da logística da Castanheira, a nova Vila Franca, a UB-18 da Póvoa de Santa Iria, e aqueles que se entreveem para a área do Sobralinho, na área em análise e o próprio Forte da Casa tem também uma nova área para fins industriais a nascer junto ao rio ao abrigo do novo PDM.
A maior parte das operações que referimos são projetos estéreis, não avançaram e não se sabe em que condições vão avançar. Apenas se registam movimentações de terras e terraplanagens, que já não será possível apagar. São operações com base em estudos de viabilidade e investimento que se revelaram errados. São um conjunto de opções políticas erradas e que se inserem num modelo de gestão do território e de desenvolvimento que não serve o país e muito menos as pessoas que nele vivem.
A uma margem fortemente industrializada no século passado (que foi caindo em decadência e abandono), somaram-se estas pressões urbanísticas dos últimos anos e esta orientação política de tornar o município de Vila Franca numa estreita mas extensa plataforma logística e de negócios ligados aos serviços. Não foi só a área mais próxima do rio a ser afetada, outras foram alvo esta captura, como é o caso da faixa de terrenos compreendida entre os caminhos de ferro e EN10 no Forte da Casa, ocupada por diversos armazéns de logística e serviços, que vieram sobrecarregar a paisagem e as vias de comunicação, eliminaram as verdadeiras hortas urbanas e que agora se encontram em decadência e desocupados.
Se é verdade que as receitas provenientes destas operações foram um importante balão de oxigénio para a autarquia, não é menos verdade que são vários os espaços vazios e a mais, os investimentos falhados outrora tidos como defensores e promotores do interesse público.
Chega de lapsos, resta pouco território pouco ou nada intervencionado. A zona das salinas de Alverca e Forte da Casa são o último reservatório de esperança. A opção correta seria aproveitar as qualidades do espaço, as limitações impostas pelo ambiente (leito de cheia) e aéreas (impostas pela base aérea), aliadas ao facto de ali estar a surgir o passeio ribeirinho, para tornar aquela zona num verdadeiro pulmão de esperança, de respeito e promoção do meio ambiente.
Se o desenvolvimento económico é importante, não é menos a sustentabilidade ambiental no quadro de um ordenamento territorial que no presente e no futuro assegure qualidade de vida aos cidadãos.
Na área, o desenvolvimento económico local pode surgir através do aproveitamento do potencial turístico que a observação das aves, em articulação com o espaço EVOA. Potencial aliás identificado até pelo próprio Plano Estratégico Nacional do Turismo (menciona ser umas das áreas com potencial de crescimento para o PIB nacional), o qual que zona encerra em si mesmo um forte fator distintivo em relação as outras regiões turísticas.
Só quem nunca visitou a área, que se estende desde Alverca até à Póvoa de Santa Iria, é que pode friamente deliberar a favor da sua extinção.
Não nos iremos deter sobre questões técnicas, nomeadamente jurídicas, essas guardamo-las para os especialistas e técnicos apesar de, a este propósito, não podermos deixar de referir a lamentável inclinação de algumas peças (de ambas as partes) que compõem o processo. Vamos assim deixar um conjunto de observações e questões:
- É paradoxal que um protocolo entre entidades, se sobreponha às normas vigentes, quer ao Plano Diretor Municipal como ao próprio plano de ordem superior PROTAML, já para não falar da classificação não governamental que citados supra.
- É paradoxal que afinal a Estrutura Ecológica Urbana não tenha a importância que o PDM em vigor lhe veio dar. Se a CMVFX reconheceu, ao aprovar o atual PDM, que aquela era uma zona importante e a preservar porque não defendeu agora essa importância e interesse, não aprovando a proposta de loteamento e enfrentando todas as consequências decorrentes?
- Poderia ter decidido de outra forma ou deixado a resolução para os tribunais. Afinal o eventual custo financeiro a pagar ao promotor será sempre inferior a todos os outros.
- Como compatibiliza a CMVFX o loteamento com o futuro e vizinho Parque Natural do Forte da Casa? Com a aposta no ambiente e na observação de aves?
- Porque razão entende a Câmara que o compromisso assumido com os cidadãos e eleitores não é para cumprir, ao contrário do que faz com o compromisso assumido com os promotores imobiliários?
- Terá a CMVFX noção que o licenciamento de tal projeto destrói uma biodiversidade e um potencial turístico que urge preservar e promover?
- Qual a duração/validade destes protocolos? São eternos ou quebram-se com o tempo ou, por exemplo, com alterações à legislação e aos planos de ordenamento em que se suportam? Quebram-se com a mudança de vontades ou, por exemplo, com a queda dos executivos camarários e novas eleições? Sinceramente não conseguimos perceber que regras regulam estas expressões vontades e de intenções passadas que nos condicionam o presente e o futuro.
- Porque é que a CMVFX não consegue apresentar outros argumentos que sustentem a viabilização do licenciamento, a não ser o mero refugio na existência de um protocolo?
É neste contexto que a associação cívica “Os Amigos do Forte” manifesta a sua indignação e preocupação sobre mais esta ameaça ao território e às salinas, deixado registado o compromisso de desenvolver todos os esforços com vista a travar este projeto, estando para isso disponível a recorrer à Justiça.
A Direção
*Treicho da intervenção realizada na sessão pública «Requalificação da Frente Ribeirrinha de Vila Franca de Xira – enfoque na zona sul», organizada pela nossa associação, em 02 de outubro de 2012.»
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